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Paraíso das Águas,29/04/2025

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Crise respiratória paralisa escolas e lota hospitais em MS

Explosão de casos expõe vulnerabilidades históricas na saúde pública do Estado


Crise respiratória paralisa escolas e lota hospitais em MS

Em Mato Grosso do Sul, a escalada dos casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) transformou a rotina de escolas, hospitais e famílias, impondo medidas emergenciais que resgatam memórias recentes da pandemia de Covid-19. No epicentro da crise, cidades como Campo Grande e Corumbá lutam contra a falta de leitos, o aumento da mortalidade infantil e a baixa adesão à vacinação, enquanto autoridades correm para conter uma situação que já levou à decretação de emergência sanitária. A epidemia respiratória atual revela não apenas a vulnerabilidade do sistema de saúde estadual, mas também um déficit histórico de consciência coletiva sobre o papel da vacinação e da prevenção.

O alarme soou alto em Corumbá (MS) nesta terça (29), quando a prefeitura suspendeu as aulas em todas as escolas públicas e privadas, diante do aumento alarmante de casos de SRAG. Com as internações crescendo, a Santa Casa de Corumbá alertou que a maioria dos pacientes internados pertence aos grupos prioritários para vacinação — muitos deles, sem a imunização atualizada. Em nota pública, o hospital destacou que, neste ano, os quadros clínicos são mais numerosos e mais graves do que os registrados no mesmo período do ano anterior.

As medidas adotadas foram enérgicas e refletem protocolos já consolidados em emergências sanitárias: isolamento de casos sintomáticos, uso de máscaras em locais de atendimento ao público, higienização intensificada, suspensão de eventos e campanha de vacinação reforçada. Mas a velocidade da disseminação viral superou a capacidade de resposta imediata.

Campo Grande, capital do Estado, vive situação ainda mais crítica. No dia 26 de abril, a prefeitura decretou situação de emergência na saúde pública, após registrar 884 casos de SRAG e 59 mortes somente na cidade. Segundo a Secretaria Estadual de Saúde (SES), o número de hospitalizações por doenças respiratórias em todo o Estado já chega a 1.940 apenas nos primeiros quatro meses do ano — uma média alarmante de 18 internações por dia.

Entre os principais agentes causadores da atual crise estão o Influenza A, o Rinovírus e, principalmente, o Vírus Sincicial Respiratório (VSR) — este último, particularmente letal para crianças menores de seis meses. Dos 987 casos de SRAG confirmados em crianças em 2025, 66 evoluíram para óbito. Os idosos, como de costume, também figuram entre as principais vítimas fatais, com 86 mortes registradas neste grupo etário.

A vacinação, embora seja o principal escudo contra as complicações respiratórias, enfrenta resistência preocupante. Em 2024, Campo Grande descartou mais de 70 mil doses de vacina contra a gripe por baixa adesão. Em 2025, a campanha de imunização foi ampliada para toda a população em uma tentativa desesperada de conter o avanço dos vírus respiratórios. Apesar disso, até agora, apenas 56 mil doses foram aplicadas, número considerado insuficiente pelas autoridades sanitárias.

A secretária municipal de Saúde de Campo Grande, Rosana Leite, em entrevista ao g1, advertiu: “É uma situação muito grave. Precisamos que a população se sensibilize e nos ajude. Além da vacina, é importante adotar medidas de prevenção, como lavar as mãos com frequência e usar máscara em caso de sintomas”.

Em meio à emergência, as 74 Unidades de Saúde da Família (USFs) da capital foram mobilizadas para vacinação em massa, e ações específicas foram organizadas em escolas, EMEIs (Escolas Municipais de Educação Infantil) e instituições de longa permanência para idosos.

O cenário atual, embora grave, não é novo na história brasileira

A pandemia de gripe espanhola, entre 1918 e 1919, ceifou mais de 35 mil vidas no Brasil, segundo o historiador Nicolau Sevcenko, autor de A Revolta da Vacina (Companhia das Letras, 1984). Desde então, ficou claro que surtos virais tendem a encontrar campo fértil onde faltam infraestrutura sanitária robusta, campanhas de vacinação eficientes e confiança pública nas autoridades de saúde.

Apesar dos avanços obtidos nas últimas décadas — como a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) em 1988, um marco constitucional de universalização da saúde —, crises como a atual revelam o quanto o país ainda enfrenta desafios estruturais. A superlotação hospitalar, denunciada reiteradamente durante a pandemia de Covid-19 (2020–2022), persiste como fantasma recorrente.

Campo Grande, atualmente, enfrenta déficit crítico de leitos pediátricos, levando a prefeitura a reestruturar Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) para servir como unidades de internação emergencial. Mas improvisações, embora necessárias em curto prazo, não substituem políticas públicas duradouras de investimento em saúde.

O impacto da crise é particularmente cruel para crianças e idosos, os grupos mais vulneráveis. Segundo o boletim InfoGripe, da Fiocruz, a mortalidade infantil associada a vírus respiratórios tem aumentado em ritmo preocupante, especialmente entre bebês com menos de um ano — faixa etária cujo sistema imunológico ainda não está plenamente desenvolvido.

De acordo com o médico e pesquisador da Fiocruz, Dr. Cláudio Maierovitch, em entrevista à BBC Brasil, “a vacinação é a principal ferramenta para salvar vidas em surtos respiratórios, mas depende de uma compreensão coletiva da responsabilidade de cada um para proteger o outro”.

A negligência histórica em campanhas de vacinação, somada à desinformação e ao negacionismo sanitário, potencializa os riscos. É impossível ignorar os danos causados por movimentos antivacina — que cresceram mundialmente nos últimos anos, impulsionados por lideranças políticas irresponsáveis e pela circulação de notícias falsas. Como destacou Yuval Noah Harari, em 21 Lições para o Século 21 (Companhia das Letras, 2018), “na era da informação, a ignorância é uma escolha deliberada e perigosa”.

Em Mato Grosso do Sul, portanto, a batalha atual é dupla: contra os vírus e contra a indiferença.
Se a vacinação em massa, a adoção de medidas preventivas e a solidariedade social prevalecerem, será possível evitar uma tragédia maior. Caso contrário, o Estado se verá mergulhado numa crise ainda mais profunda, com perdas humanas irreparáveis.

A epidemia silenciosa que hoje paralisa escolas, lota hospitais e tira vidas em Mato Grosso do Sul é um lembrete brutal: saúde pública não é questão de opção política, mas de sobrevivência coletiva.

Fonte Semana ON MS




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